Votação apertada foi decidida com voto da presidente da corte, ministra Cármen Lúcia |
BRASÍLIA – Por seis votos a cinco, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira que o ensino religioso nas escolas públicas deve ser confessional, com aulas ministradas pelo representante de uma determinada crença. O julgamento foi retomado hoje com os votos de Celso de Mello, Marco Aurélio Mello e a presidente da corte, Cármen Lúcia – que desempatou a votação no último voto.
"Não consigo vislumbrar nas normas autorização para o proselitismo ou catequismo. Não vejo nos preceitos proibição que se possa oferecer ensino religioso com conteúdo especifico sendo facultativo", disse Cármen Lúcia.
Celso e Marco Aurélio defenderam o ensino religioso neutro, com informações sobre várias crenças. Eles são contrários à proposta de aulas ministradas por representantes de uma determinada religião e votaram por aulas sobre o papel das religiões na história e na sociedade, sem a possibilidade de um padre, um pastor ou rabino, por exemplo, professarem sua fé perante os alunos.
"O Estado laico não pode ter preferência confessional e não pode interferir na esfera das escolhas religiosas", disse Celso de Mello, o mais antigo integrante do STF, completando:
"Em matéria confessional, o princípio da laicidade do Estado será efetivamente respeitado se, tratando-se de ensino religioso, este não tiver conteúdo confessional, pois o aparelho estatal, para manter neutralidade, não poderá viabilizar na escola pública a ministração de aula que se refira a uma ou algumas denominações religiosas"
.Para o decano, com o ensino confessional instituído, poderia haver o risco de grupos religiosos tentarem impor aos demais cidadãos diretrizes de crenças específicas. Marco Aurélio votou na mesma linha.
"O quadro impõe ao Supremo, enquanto última trincheira da cidadania, atuar em defesa do pluralismo religioso e do Estado laico, afastando a possibilidade de representantes de entidades religiosas ministrarem, nessa condição, a disciplina. É tempo para atentar para o lugar da religião na sociedade brasileira. Esta, embora aspecto relevante da comunidade, digno de tutela na Constituição Federal, desenvolve-se no seio privado, no lar, na intimidade, nas escolas particulares. Nas públicas, espaço promovido pelo Estado para convívio democrático das diversas visões do mundo, deve prevalecer a ampla liberdade de pensamento, sem direcionamento estatal a qualquer credo", afirmou Marco Aurélio.
O julgamento começou em agosto, foi retomado na semana passada e deve ser finalizado nesta quarta-feira. Votaram pelo ensino confessional os ministros Edson Fachin, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Alexandre de Moraes e Cármen Lúcia. Para esses ministros, as aulas podem ser ministradas por um representante de uma determinada crença, que pode professar sua fé perante os alunos.
Por outro lado, Luís Roberto Barroso, Marco Aurélio, Rosa Weber, Luiz Fux e Celso de Mello votaram pelo ensino não confessional, com base no princípio constitucional da laicidade do Estado.
O voto de Gilmar, dado na semana passada, foi um dos mais contundentes. Ele criticou a “ditadura do politicamente correto” e destacou que, embora o Estado seja laico, a religião tem um papel importante na formação do Brasil. Ele ironizou, questionando se seria o caso de se discutir a retirada a estátua do Cristo Redentor do morro do Corcovado, por simbolizar a influência cristã no país.
A Constituição estabelece que “o ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental”. No processo em julgamento, a Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu que o STF interpretasse esse trecho de modo a proibir o ensino confessional.
Cinco ministros consideraram, no entanto, que o fato de ser facultativo o ensino religioso não obriga estudantes a participar das aulas. Por isso, não haveria desrespeito a crenças diferentes da lecionada na escola. Os ministros também ponderaram que a disciplina não pode ser transmitida como se fosse uma ciência. Portanto, apenas alguém ligado a uma religião poderia lecionar.
A outra corrente do tribunal argumentou que, ao se desvincular da aula, o aluno pode passar por constrangimento. Os ministros também são contrários à contratação de professores para a disciplina por recomendação de determinada religião. Padres, pastores, rabinos ou ateus poderiam ministrar a aula, desde que fossem aprovados em concurso público.
FONTE: O GLOBO
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